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Fax of Life
1996. Acrílico s/ tela, madeira e aparelho de fax, 125X195X10 cm. Foto: Ole Friis





Aquarium
1996. Acrílico s/ tela, areia, madeira, aquário e peixe, 125X195X35 cm. Foto: Ole Friis



 


 


Roy Lawaetz

Por Marianne de Tolentino

Aqueles que atribuem à arte caribenha algo mais do que uma formulação tradicional e ingênua observam nas suas expressões a tripla filiação que verdadeiramente tem: o legado indígena pré-colombiano, a herança africana e a influência européia ligada à colonização e às culturas exteriores dominantes. Além disso tudo, com diferenças que mudam de uma ilha para a outra, estão os rastros das civilizações orientais minoritárias e, de forma mais recente, a atração exercida pelos Estados Unidos. É reconhecido que a origem africana é um denominador comum, presente na escravidão e em uma população predominantemente negra. Além disso, a presença da Europa, além do fator político, vem sendo obsessivamente necessária nas artes plásticas modernas como um modelo a ser seguido, embora com um atraso, em geral, de meio século...

No entanto, observamos um renascer das influências indígenas, aruaque e, principalmente, taína, de origem eminentemente intelectual. Trata-se de um passado desaparecido, quase que totalmente exterminado durante os primeiros cinqüenta anos da colonização. Uma pesquisa de seus traços artísticos está sendo feita atualmente, de modo a integrá-los à criação atual, o que significa um processo ideológico, uma forma de reivindicação de uma cultura perseguida e abolida. Além disso, esses povos tinham um importante desenvolvimento da visualidade que se conserva parcialmente em objetos e hieroglifos em pedras, cujas formas essenciais estão em completo acordo com a contemporaneidade 'ocidental'. Por isso, encontramos no Caribe uma crescente preocupação para levar os esquemas e geometrismos taínos - sempre anônimos - à criação atual, personalizada e assinada.

Esse fenômeno acontece na pintura de Roy Lawaetz, um artista maduro, natural das Ilhas Virgens, de renome internacional. O artista evoluiu a partir de uma linguagem barroca figurativa, de cores fortes, rica em morfologias e pinceladas, com fundo de voluntária influência negra e socio-econômica em suas referências temáticas, para obras mais depuradas e construídas, para a modificação do suporte em seus contornos e extensão, para o uso do político, com um número variável de elementos.

Houve realmente um processo de 'desmaterialização' quando Roy Lawaetz abandonou a tela retangular, ao unir painéis deixando espaços vazios, ao acrescentar o ready-made e a tridimensionalidade, como comprovamos nas peças com que participa da 23ª Bienal Internacional de São Paulo. O artista relaciona a obra de arte com a história antiga e, mais exatamente, com a pré-história caribenha. Para isso, suas viagens à República Dominicana e suas coleções arqueológicas desempenharam seu papel, mostrando-lhe testemunhos ignorados e uma particular riqueza formal. Se não fez surgir, ao menos fortaleceu muito a tainización, assimilada à triangulação, modalidade que o artista continua investigando.

A utilização da geometria e, particularmente, do triângulo tem uma vigência generalizada nas expressões artísticas 'primordiais' - adjetivo que é ao mesmo tempo mais amplo e menos pejorativo que 'primitivo'. Essas formas são encontradas até nas figuras orientais de meditação, 'yantras', em que dois triângulos se unem, ou nas mandalas dos nove triângulos enlaçados, que simbolizam a plenitude e a complementação, a relação entre o homem e a natureza, assim como o caráter erótico e emocional, sem deixar de lado uma reminiscência da casa dos espíritos ancestrais. Certamente, em um contexto geográfico e cultural muito diferente, cada um desses conceitos encontra lugar no trabalho atual de Roy Lawaetz...

No entanto, o padrão triangular adotado pelo artista pertence aos antepassados antilhanos: 'Antilha' é uma palavra de origem taína. Esse povo utilizava ícones e tricúspides, relacionados provavelmente com a reprodução e a fecundidade, e os denominados trigonolitos correspondiam às divindades protetoras. De acordo com o que Cristóvão Colombo escreveu em seu diário, os caciques acreditavam que as pedras melhorariam as colheitas, trariam a água e o sol e ajudariam as mulheres a dar à luz sem dor. Não está bem explicado o mistério dessas combinações antropomórficas e zoomórficas, em sua evocação representativa... sempre ritual e sacralizada.

Roy Lawaetz, conservando as formas e até os conceitos dessa linguagem simbólica taína, constrói seus tótens e ídolos utilizando como base o triângulo e o desenho contemporâneo. A partir do mesmo princípio de união de uma mesma morfologia global e composta, o artista faz a fusão do ancestral e do presente, do permanente e do temporal. Cada uma das peças refere-se à mulher com as pernas abertas e sua índole sexual e maternal pelos séculos dos séculos. Mas, no seu interior são gerados, por meio de objetos inseridos, artefatos e novos mitos, o fax, a comunicação instantânea, o vidro de perfume ou a incitação ao consumo, a produção musical - que inclui instrumentos tradicionais. À medida que Roy Lawaetz trabalha, outros objetos/signos/símbolos irão sendo acrescentados, repetindo o padrão formal. Mostraremos duas leituras - da mesma forma que no trigonolito taíno -, uma geométrica e externa, outra figurativa e interna que necessita de uma decodificação individualizada. A execução expressionista é veemente e o cromatismo intenso.

Conhecendo Roy Lawaets, induzimos a índole polissêmica da sua obra, que vai sendo enriquecida à medida que é construída. Limitamo-nos a uma das propostas interpretativas deste artista, habitante das Ilhas Virgens e do Caribe.

Marianne de Tolentino é presidente da Associação Dominicana de Críticos de Arte



Cronologia


Nasceu em 9 de dezembro de 1942, em Frederiksted, na ilha de St. Croix, Ilhas Virgens. Estudou artes plásticas com Victor Candell e Leo Manso. Foi bolsista da Provincetown Workshop, do Candell Studio e do NYU Studio XII de Nova York e da Royal Academy for Fine Arts. Realizou mostras individuais na República Dominicana e nas Ilhas Virgens e mostras coletivas nos Estados Unidos, Caribe e Europa.


Exposições individuais

1995
Club Jardin, Hotel Jaragua, Santo Domingo, República Dominicana; El Baorucco, Cabarete, República Dominicana.
1994
Museo de Arte Moderno, Santo Domingo, República Dominicana.
1993
Barclay's Bank, St. Croix, Ilhas Virgens.


Exposições coletivas

1996
Carib Art, UNESCO Headquarters, Paris, França; Frederiksted Art Gallery, St. Croix, Ilhas Virgens; Salon de Arte, Santo Domingo, República Dominicana.
1995
Carib Art, Bermuda National Gallery, Bermudas; Carib Art, Bermuda Society of Art, Bermudas; Carib Art, Bermuda Arts Centre, Bermudas; Salon de Arte, Santo Domingo, República Dominicana.
1994
Altos de Chavon Galeria, Altos de Chavon, República Dominicana; Carib Art, Grand Cayman, Ilhas Cayman; Carib Art, Centro Calguetio, Oranjestad, Aruba; Second Biennial of Caribean and Central American Painting, Museo de Arte Moderno, Santo Domingo, República Dominicana; Caribean Art Today, Documenta Halle, Kassel, Alemanha; International Biennial of Painting, Cuenca, Equador; International Festival of Painting, Chateau-Musée Grimaldi, Cagnes-sur-Mer, França; Seventh Annual Caribean Fine Art Exhibit, St. Croix, Ilhas Virgens.
1993
500 Years After: Central American and Caribean Painting Today, Museum of the Americas, Washington DC, Estados Unidos; Fort Frederik Museum, St. Croix, Ilhas Virgens; Camille Pissarro Gallery, St. Thomas, Ilhas Virgens; Bedford-Stuyvesant Center/Arts and Culture, Nova York, Estados Unidos; First Annual Earth Day Art Exhibit, Government House, St. Croix, Ilhas Virgens; Carib Art Jury, exposição itinerante patrocinada pela Unesco, Curaçao; Caribbean Colour Exhibit, St.Thomas, Ilhas Virgens.