| Por Roberto Guevara
Soto - A Realidade como Energia
A realidade como energia introduziu uma profunda revolução no campo da investigação artística. Esse têm sido o objetivo da obra de Jesús Soto desde os primeiros anos da década de 50, quando deu início a seu implacável processo de busca de novas estruturas para perceber, comunicar e divulgar, no âmbito do universo imediato e extenso, o mundo real e o imaginável. Desse modo, ele dava início a mudanças radicais e iniciava uma nova era.
A consistência do mundo material como postulado fundamental parecia uma noção confiável e permanente para os homens do século XIX. As mudanças radicais propostas pelos conceitos de Einstein e Plank, porém, estabeleceram novas bases para a interpretação do espaço, da luz e até da própria matéria. Os princípios dialéticos profetizados por Heráclito de Éfeso há 25 séculos sugeriam um universo em gênese permanente, baseado no princípio de energia (fogo), que flutua sem cessar, convertendo assim a realidade em vir a ser. Parmênides inaugurou uma negação desse princípio, pois não podia admitir no âmbito da lógica formal um universo que pudesse ser e não ser ao mesmo tempo. A arte refletiu durante milênios um conceito estético aceito pela tradição como representativa do universo circundante. Gabo e Pevsner, no famoso Manifesto Realista de 1920, reivindicaram uma nova arte que incluísse o movimento real e não a arte de 'ritmos estáticos'.
Calder criou seus 'móbiles' harmoniosos e, muito mais tarde, Tinguely deu início a suas peças industriais articuladas, com movimentos sincopados, que lembram as toscas engrenagens das máquinas. Para Jesús Soto, era necessário ir mais longe. a questão da dinâmica do universo e a constituição da matéria não podiam se restringir a uma proposta subjetiva nem, como ele próprio afirma, 'a uma coisa que se move'; a questão era, pelo contrário, 'uma relação'.(1)
Assim tem início o processo para determinar a realidade como estruturas invisíveis, sensíveis por intermédio da arte como fato atual, interativo, que o homem contemporâneo pode vivenciar. Trata-se de um processo que implica de modo pleno a desmaterialização da obra de arte e a abordagem de toda a realidade como energia.
Soto começa por criar um novo alfabeto para a arte, semelhante ou equivalente ao da música, por meio do qual transforma a obra em proporções seriais e repetitivas, nas quais o olho fica livre para a leitura. rompe com a tradição clássica e renascentista da forma e da composição, que substitui pelas noções novas de elemento e estrutura. Os elementos são equivalentes entre si e a estrutura é invisível, uma força de coesão. Em sua investigação, Soto justapõe planos e cria uma nova leitura deles, que se transformam e criam uma mobilidade de transmutação. A ausência de estabilidade dos elementos colocados em planos em relevo sobre o traçado vertical de linhas brancas e fundo negro provoca, de início, uma vibração. Em seguida, como consequência imediata, a desmaterialização.
Frente a uma obra de pingentes sobre um fundo listrado, a percepção se desloca, como se fosse um rio heracliteano, e não sabemos mais onde estão essas linhas que se insinuam e desaparecem continuamente. Soto desenvolve novos modos de percepção, de se comunicar e de penetrar as categorias constituidoras. As extensões e progressões abordam o espaço real e criam um novo. Os penetráveis, como aquele efêmero apresentado no Museu Guggenheim de Nova York (1976), criam, de modo vivencial, uma participação no volume, tornam-se parte essencial, possibilitam o sentido tátil, sonoro, real e virtual ao mesmo tempo, definido e redefinido à medida em que passamos por ele.
Em sua evolução, a obra de Soto dialoga com a natureza, com o espaço urbano e com a situação do homem no interior dos espaços habitados. Talvez o precedente importante seja a obra que ele criou para o hall do edifício da Unesco em Paris (1969), uma experiência singular de ambientação contínua, que se completa à medida que o visitante a penetra, oferecendo alternativas, promovendo encontros. Seguiram-se muitas experiências feitas em edifícios públicos, centros culturais, sedes de bancos e indústrias ou mesmo nas próprias ruas. Todas foram feitas para promover a visão com ausência de estabilidade, o impulso de recriar leva a obra de Soto ao homem comum, um entre muitos, em situações diferentes, espontâneas, imprevisíveis. Isto têm ocorrido na sede do restaurante da fábrica da Renault, Paris (1975); no Centro Georges Pompidou, na mesma cidade, em 1987; assim como no Banco do Canadá, em Toronto (1977); e no Teatro Teresa Carreño em Caracas (1980). No Festival de Arte Efêmera realizado no Brasil ou nos Jogos Olímpicos de Seul ou nas Férias Internacionais do Japão o mesmo processo teve lugar. Sempre com um sucesso surpreendente, um acontecimento que nos dá a sensação de ter perdido o chão no qual nos apoiamos, que nos deixa em suspenso, para reconsiderar rapidamente as idéias sobre o que considerávamos anteriormente como seguro e estável.
Quem teve a oportunidade de ver estes Volúmenes Suspendidos de Soto ou suas grandes Esferas, com suas varetas pendentes, certamente terão vivenciado a sensação de transmutação, de desmaterialização que ocorre diante dos nossos próprios olhos, assim como a sensação de estar frente a algo insólito. Ao deparar com essas obras de grande formato, o transeunte percebe como se 'engendra' uma massa de cor que se desprende, se move conosco, em um espaço impossível de ser situado e até difícil de ser concebido. Então nos lembramos das palavras de Soto, citadas por Marcel Joray em seu livro: "uma preocupação que sempre me perseguiu ao longo de minhas pesquisas plásticas: como conseguir fazer com que a matéria voltasse a adquirir seu valor essencial, isto é, a energia...".
1. Joray, Marcel e Soto, Jesús Rafael; Soto, Editions du Griffon, Neuchâtel, Suíça, 1984.
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| Nasceu em Ciudad Bolívar, Venezuela, em 1923. Estudou na Escuela de Bellas Artes de Caracas e de 1947 a 1950 foi diretor da Escuela de Artes Plásticas de Maracaibo. Em 1970 foi inaugurado em Ciudad Bolívar o Museo de Arte Moderno Jesús Soto. Mudou-se para Paris em 1950, cidade onde vive até hoje.
Exposições individuais
1995 Art Miami'95, Miami, Estados Unidos; Hyundai Gallery, Seul, Coréia do Sul. 1994 In Khan Gallery, Nova York, Estados Unidos. 1993 Fundação de Serralves, Porto, Portugal; Museo de Arte Moderno, Fundación Jesús Soto, Ciudad Bolívar, Venezuela. 1992 Le Carré/Musée Bonnat, Bayonne, França; Museo de Bellas Artes, Caracas, Venezuela. 1991 Galleria Arte 92, Milão, Itália. 1990 Galería Theo, Madri, Espanha. 1989 Galerie Hermanns, Munique, Alemanha. 1988 Elisabeth Franck Gallery, Knokke-Le-Zoute, Bélgica. 1986 Contemporary Sculpture Center, Tóquio e Osaka, Japão. 1985 Center for the Fine Arts, Miami, Estados Unidos. 1983 Museo de Arte Contemporáneo de Caracas, Venezuela. 1982 Palacio de Velázquez, Madrid, Espanha; Fundació Joan Miró, Barcelona, Espanha. 1981 Museo de Arte Contemporáneo Francisco Narvaez, Porlamar, Venezuela; Casa de Colón, Las Palmas de Gran Canaria, Espanha. 1980 Galleri Ferjm, Malmo, Suécia. 1979 Helsinki Kaupungin Taidekokoelmart, Helsinque, Suécia; Musée National d'Art Moderne, Centre Georges Pompidou, Paris, França. 1978 Louisiania Museum, Humlabaek, Dinamarca; Liljevalchs Konsthalle, Estocolmo, Suécia. 1976 Galerie Watari, Tóquio, Japão. 1975 Joseph Hirshhorn Museum, Washington, DC, Estados Unidos. 1974 Salomon Guggenheim Museum, Nova York, Estados Unidos. 1972 Galeri Beyeler, Basiléia, Suíça; Galerie Pauli, Lausanne, Suíça. 1971 Museum of Contemporary Art, Chicago, Estados Unidos. 1970 Galleria della Nuova Loggia, Bolonha, Itália; Kunstverein, Mannheim, Alemanha. 1969 Palais des Beaux-Arts, Bruxelas, Bélgica; Musée d'Art Moderne de la Ville de Paris, França. 1968 Kunsthalle, Berna, Suíça; Stedelijk Museum, Amsterdã, Holanda. 1964 Galerie Müller, Stuttgart, Alemanha. 1959 Galerie Iris Clert, Paris, França. 1956 Galerie Denise Ren, Paris, França. 1949 Taller Libre de Arte, Caracas, Venezuela.
Exposições coletivas
1995 21 Biennale Internationale Graphique de Ljubljana, Liubliana, Eslovênia; Mode et Art 1960-1990, Palais des Beaux-Arts, Bruxelas, Bélgica; II Exposición Internacional de Esculturas en la Calle, Santa Cruz de Tenerife, Canárias. 1994 IV Bienal Internacional de Pintura, Cuenca, Equador; 22ª Bienal Internacional de São Paulo, Brasil; Fragmentos para um Museu Imaginário, Fundação de Serralves, Porto, Portugal. 1993 Collection de la Fondation Maeght, Saint-Paul-de-Vence, França; 1ère Triennale des Amériques - Présence en Europe 1945-1992, Espace Sculfort, Maubeuge, França; Manifeste, une Histoire Parallèle 1960-1990, Musée National d'Art Moderne, Centre George Pompidou, Paris, França; Akademie 1993 - Mitglieder ausstellung mit Gästen, Akademie der Künste, Berlim, Alemanha; Die verlassenen Schune, Landesmuseum, Bonn, Alemanha. 1992 New Realities - Art in Western Europe 1945-1968, Tate Gallery, Liverpool, Inglaterra; Musée National d'Art Moderne, Centre Georges Pompidou, Paris, França; Museum Ludwig, Colônia, Alemanha; From Torres-García to Soto, Art Museum of the Americas-Organization of the American States, Washington DC, Estados Unidos. 1991 La Mémoire de la Liberté, Centre Georges Pompidou, Paris, França. 1989 Art in Latin America, Hayward Gallery, Londres, Inglaterra; Nationalmuseum and Moderna Museet, Estocolmo, Suécia; Centro de Arte Reina Sofía, Madri, Espanha; Art Chicago, Chicago, Estados Unidos. 1988 The Latin American Spirit: Art and Artists in the United States 1920-1970, The Bronx Museum of the Arts, Nova York, Estados Unidos; 15 Masters of Contemporary Sculptures, Hyundai Gallery, Seul, Coréia do Sul. 1987 Art pour l'Afrique, Musée des Arts Africains et Océaniens, Paris, França. 1986 Contrasts of Form: Geometric Abstract Art 1910-1980 from the Guggenheim Museum and the Museum of Modern Art of New York, exposição itinerante: Biblioteca Nacional, Madri, Espanha; Museo Nacional de Bellas Artes, Buenos Aires, Argentina; MASP, São Paulo, Brasil; Museo de Arte Contemporáneo, Caracas,Venezuela; Tendências na Arte Abstrata Geométrica, The Tel Aviv Museum, Tel Aviv, Israel. 1984 Salon Grands et Jeunes d'Aujourd'hui, Paris, França. 1983 International Engraving Exhibit, Liubliana, Eslovênia. 1982 60-80 Attitudes-Concepts-Images, Stedelijk Museum, Amsterdã, Holanda. 1981 Paris-Paris, Centre Georges Pompidou, Paris; Arte Contemporânea na América Latina e no Japão, Museu Nacional de Arte, Osaka, Japão. 1980 Le Défi à la Peinture 1950-1980, Paris, França. 1979 Arte Constructivo Venezolano 1945/1965, Galería Arte Nacional, Caracas, Venezuela. 1978 L'Oeil en Action, Centre Georges Pompidou, Paris, França; América Latina, Geometria Sensível, Rio de Janeiro, Brasil. 1975 Bienal International de Gravura, Museu Nacional de Arte Moderna, Tóquio, Japão. 1973 Internationale Kunstmesse, 3, Düsseldorf, Alemanha. 1972 12 Ans d'Art Contemporain, Galeries Nationales du Grand Palais, Paris, França; The Non-Objective World 1939-1955, Annely Juda Fine Art, Londres, Inglaterra; Galerie Liatowitsch, Basiléia, Suíça; Galleria Milano, Milão, Itália; Düsseldorf, Alemanha; Talbot Rice Art Centre, Universidade de Edimburgo, Escócia. 1971 Multiples, the First Decade, Philadelphia Museum of Art, Filadélfia, Estados Unidos. 1969 Bienal de Nuremberg; Bienal Middleheim, Antuérpia, Bélgica. 1968 L'Art Vivant, Fondation Maeght, Saint-Paul de Vence, França; Cinétisme, Environnements, Spectacle, Maison de la Culture, Grenoble, França; Multiples, Wallraf-Richartz Museum, Colônia, Alemanha; Art Cinétique et Espace, Maison de la Culture, Le Havre, França/Kunstnernes Hus, Oslo, Noruega; Haus der Kunst, Munique, Alemanha; Le Musée dans l'Usine, Pavilhão de Marsan, Museu do Louvre, Paris/Palais des Beaux-Arts, Bruxelas, Bélgica/Stock Exchange, Berlim, Alemanha; Environnements, Kunsthalle, Berna, Suíça; Le Silence du Mouvement, Kröller-Müller Museum Otterlo, Holanda/Musée d'Art Moderne, Bruxelas, Bélgica; Soto, Vasarely, Le Parc, Ritchie Hendriks Gallery, Dublin, Irlanda/Ulster Museum, Belfast, Irlanda do Norte/Art Gallery, Bedford, Inglaterra/Redfern Gallery, Londres, Inglaterra. 1967 Lumière et Mouvement, l'Art Cinétique à Paris, Musée d'Art Moderne de la Ville de Paris, Paris, França; International Exhibition of Contemporary Painting and Sculpture, Carnegie Institute, Pittsburgh, Estados Unidos. 1966 Weiss und weiss, Kunsthalle, Berna, Suíça; Biennale di Venezia; Salon Comparaisons, Paris, França. 1965 Anthology of Kinetik Sculpture and Perceptual Art, Signals, Londres, Inglaterra; Lumière, Mouvement et Optique, Palais des Beaux-Arts, Bruxelas; Licht und Bewegung, Kunsthalle, Berna/Baden-Baden/Düsseldorf, Alemanha. 1964 Biennale di Venezia. 1963 7ª Bienal de São Paulo, Brasil. 1962 Biennale di Venezia; Nul, Stedelijk Museum, Amsterdã, Holanda. 1961 Bewogen beweging, Stedelijk Museum, Amsterdã/Moderna Museet, Estocolmo/Louisiana Museum, Humlebaek, Dinamarca; Zero, Düsseldorf, Alemanha. 1960 Konkrete Kunst - 50 Jahre Entwicklung, Helmbaus, Zurique, Suíça. 1959 5ª Bienal de São Paulo, Brasil. 1958 Biennale di Venezia; Brussels International Exhibition, Bruxelas, Bélgica. 1º Festival de Arte de Vanguarda, Cité Radieuse Le Corbusier, Marselha, França. 1957 4ª Bienal Internacional de São Paulo, Brasil. 1951/68 Salon des Réalités Nouvelles, Paris, França. 1943/49 Salón Anual de Arte Venezuelano, Caracas, Venezuela.
Prêmios
1995 Grand Prix National de la Sculpture, França. 1994 Doctor Honoris Causa, Universidad Nacional Experimental de Guayana, Ciudad Bolívar, Venezuela. 1993 Commandeur de l'Ordre des Arts et des Lettres, França. 1990 Médaille Picasso (Vermeil), Unesco, Paris, França; Doctor Honoris Causa en Arquitectura, Universidad de los Andes, Mérida, Venezuela; Orden Antonio José de Sucre en su Primera Clase, Cumaná, Venezuela. 1989 Médaille des Arts Plastiques, Académie d'Architecture, Paris, França. 1983 Orden Francisco de Miranda en 1er Grado, Venezuela. 1979 Conseiller d'Honneur de l'Association Internationale des Arts Plastiques, Unesco, Paris, França. 1972 Orden Andrés Bello en 1er Grado, Venezuela 1968 Chevalier de l'Ordre des Arts et des Lettres, França. 1963 7ª Bienal Internacional de São Paulo, Brasil 1960 Premio Nacional de Pintura, Venezuela.
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