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Wise Owl #6
1996. Tinta verniz s/ painel de alumínio, 218X180 cm. Foto: Stephen White





Sky Painting
1995. Tinta esmalte s/ alumínio, 366X244 cm. Foto: Cortesia de Jay Joplin, Londres



 


 


Gary Hume

Por Simon Bill
Londres, junho de 1996

É muito difícil falar sobre o trabalho do pintor Gary Hume. Em geral os escritores recorrem a uma história resumida do seu trabalho - de portas de hospital até figuras pós-pop - porque este é curiosamente resistente a qualquer exegese além de uma descrição direta dos fatos empíricos. Na verdade, eles são muito simples de se descrever - pintura envernizada sobre painel, m.d.f. ou alumínio, imagens pop etc. -, mas são bastante difíceis de explicar.

Hume surgiu durante o movimento Theory Boom, da década de 80, quando criticar era a regra, e o trabalho de arte tornou-se uma corrida de obstáculos, de proibições e avisos. O prazer não era permitido; a auto-expressão não era aceita; a pintura também não era bem vista. A arte tinha de fazer sentido. O trabalho de Hume, no entanto, apresenta um tipo de reflexão voltada para si mesmo, uma consciência da condição da pintura no final do século XX; mas também se baseia em sua ampla experiência subjetiva de seus próprios apetites, paixões, gostos e aversões. As pinturas de Hume tratam de sentimentos.

O artista não pode ser acusado de ficar aferrado, inconscientemente, a atos de fé redundantes como autenticidade e auto-expressão, mas também não se pode falar de seu trabalho em termos críticos ou irônicos. Está tudo lá, faz parte da trama, mas exibe formas com as quais não tínhamos ainda travado conhecimento. A nossa linguagem não é ágil quando se trata de se adaptar ao desenvolvimento artístico (assim como em qualquer outra área), e o vocabulário pós-moderno não é suficiente. Os escritores passam a precisar de novas palavras.

Seus primeiros trabalhos, as pinturas em portas, podem ter sido uma crítica da pintura modernista 'não-representativa', brincando, como ela o fazia, com a semelhança entre uma pintura branca e uma porta pintada de branco - um trocadilho visual -, mas não é isso que ele está fazendo atualmente. Este tipo de autoconsciência ainda está presente mas não é esse seu objetivo. E quando olhamos novamente para essas portas, a crítica não parece ser algo tão importante em seu significado quanto era no trabalho de muitos outros artistas de sua geração. (É uma tentação utilizar palavras como 'pathos' e 'nostalgia', mas elas também não parecem muito adequadas).

O novo trabalho de Hume é envolvente. É totalmente consciente do fato de que os desejos e as opiniões que gostamos de considerar ou que sentimos como se fossem nossos são na realidade de segunda mão, herdados. Mas seu trabalho não permite que esse truísmo de fim do século XX obtenha a liderança. Sim, é verdade que o meu ser é construído, um efeito, e que as coisas de que gosto e o que penso são encontradas em lojas, filmes, revistas etc., exatamente para que eu goste e pense nelas. Não posso mais escolher as coisas que a minha cabeça absorverá, como também não posso escolher minha linguagem pessoal. Mas essas coisas, meus gostos e aversões, ainda são meus e os meus sentimentos sobre eles também são meus.

Uma estratégia usual no trabalho de Hume é começar a partir de uma imagem familiar -uma foto de alguma pessoa famosa, algumas flores, qualquer coisa - e sem realmente distorcê-la, alterá-la de uma forma tal que, quando se vê a pintura, o tema fique dando voltas em sua mente. É uma reminiscência do que acontece quando olhamos para o pato-coelho de Jastrow, ou o famoso retrato de dois perfis que também representa um vaso quando se inverte o relacionamento da figura com a base. Com freqüência a figura e a base recebem a mesma ênfase nas pinturas de Hume, uma metáfora (provavelmente não-intencional) do próprio relacionamento do artista com a cultura em geral.

As pinturas de Hume são sinceras e comprometidas. A escolha de cores e do tema, que pode ser - e muitas vezes é - considerada ironicamente de mau gosto, ou mesmo sarcástica, pretende ser bela e humana. ('beleza' e 'humanidade' são duas palavras que Hume utiliza muito quando fala sobre seu trabalho). Ele quer investir seu trabalho de um tipo de integridade moral, prática e cotidiana. O que seus trabalhos têm, sem dúvida, como se fosse uma base, é um rigor intelectual - um tipo de integridade diferente. Com a invenções de outras formas de pintar e a ameaça da redundância, a pintura conseguiu encontrar seu lugar, concentrando-se nas coisas consideradas exclusivas da pintura e desconsiderando as coisas que também podiam ser alcançadas por outros meios mais recentes. Acreditava-se que a representação figurativa comprometia a integridade da pintura, pois solapava seu direito à vida.

As pinturas figurativas de Hume fazem coisas que não podem ser feitas de nenhuma outra forma, sua concepção é completa. O tipo de pintura, o tipo de suporte, a cor, o tratamento da imagem são bastante específicos e essenciais ao trabalho enquanto objeto. O que surpreende é que - embora sendo bastante específicas e informadas - muitas das decisões tomadas em seu trabalho parecem ser perversas. Apesar da simplicidade dos meios utilizados e dos temas pueris, esses trabalhos conseguem manter um elemento oculto. O que eles mantêm oculto é aquilo sobre o que todos querem falar, mas não conseguem.

As pinturas de Hume questionam qual o tipo de prazer que iremos nos permitir, uma vez que estamos conscientes do que está ocorrendo no mundo, na cultura e em nós mesmos. O substrato do conhecimento e a sugestão de um universo racional oculto nos permitem desfrutar os temas humanos e cores lindas. Podemos, ao mesmo tempo, reconhecer e ignorar todas as questões sobre o mau gosto e a má-fé ao mesmo tempo em que olhamos e apreciamos.



Cronologia


Nasceu em Kent, Inglaterra, em 1962. Formou-se no Goldsmith's College em Londres. Atualmente mora e trabalha em Londres. Realizou exposições individuais na Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos e participou de exposições coletivas na Europa e nos Estados Unidos.


Exposições individuais

1996
Gary Hume, Galerie Gebauer and Günther, Berlim, Alemanha.
1995
Gary Hume, Jay Jopling/White Cube, Londres, Inglaterra; Gary Hume, Kunsthaller, Berna, Suíça; Gary Hume, ICA, Londres, Inglaterra; Gary Hume, Spacex Gallery, Exeter, Inglaterra; My Aunt and I Agree, Habitat, Londres, Inglaterra.
1994
Gary Hume, Matthew Marks Inc., Nova York, Estados Unidos.
1993
Gary Hume, Galerie Tanja Grunet, Colônia, Alemanha.
1992
Recent Paintings, Daniel Weinberg Gallery, Santa Monica, Estados Unidos; Recent Paintings, Matthew Marks Inc., Nova York, Estados Unidos.
1991
Tarpaulins, Galerie Tanja Grunet, Colônia, Alemanha; The Dolphins Paintings, Karsten Schubert Ltd, Londres, Inglaterra; Recent Works, Karsten Schubert Ltd, Londres, Inglaterra.


Exposições coletivas

1996
British Art Show 4, exposição itinerante em Cardiff, País de Gales; Festival of Cont. British Arts, exposição itinerante em Roma, Itália; A Small Shifting Sphere of Serious Culture, ICA, Londres, Inglaterra.
1995
Biennale di Venezia, Veneza, Itália; Minky Manky, South London Gallery, Londres, Inglaterra; Minky Manky, Arnolfini, Bristol, Inglaterra; From Here, Waddington Galleries/Karsten Schubert Gallery, Londres, Inglaterra; Brilliant Art from London, Walker Art Center, Minneapolis, Estados Unidos; British Art Show 4, exposição itinerante em três locais: Manchester, Inglaterra; Edimburgo, Escócia; Cardiff, País de Gales; Hardcore (Part II), Factual Nonsense, Londres, Inglaterra; Wild Walls, Stedelljk Museum, Amsterdam, Holanda; Gavin Brown's, Nova York, Estados Unidos.
1994
Unbound, Hayward Gallery, Londres, Inglaterra; Beauty is Fluid, PPQ, Londres, Inglaterra; Portraits, Karsten Schubert, Londres, Inglaterra; Close Up, Time Square, Nova York, Estados Unidos; Anthony Reynolds, Londres, Inglaterra; Wonderful Life, Lisson Gallery, Londres, Inglaterra; Lucky Kunst, exposição itinerante em dois locais: Nova York, Estados Unidos; Londres, Inglaterra; New Voices, Musée National d'Histoire, Luxemburgo.
1992
Instructions Received By, Gio Marconi Gallery, Milão, Itália; Galerie Tanja Grunert, Colônia, Alemanha; New Voices: New Works, British Council Collection, Centre de Conference, Bruxelas, Bélgica; Barbara Gladstone Gallery, Nova York, Estados Unidos; Matthew Marks Inc., Nova York, Estados Unidos; Karsten Schubert Ltd, Londres, Inglaterra; Etats Specifiques, Musée des Beaux-Arts, Le Havre, França; 5th Anniversary Show, Karsten Schubert Ltd, Londres, Inglaterra.
1991
Act-Up Benefit, Paula Cooper Gallery, Nova York, Estados Unidos; Confrontations, Rena Sofia, Madri, Espanha; Broken English, Serpentine Gallery, Londres, Inglaterra; Matthew Marks Inc., Nova York, Estados Unidos; Artists Sketchbooks, Matthew Marks Inc., Nova York, Estados Unidos; Karsten Schubert Ltd, Londres, Inglaterra.
1990
East Country Yard Show, Londres, Inglaterra; The Cologne Show, Cologne; The British Art Show 1990, exposição itinerante em três locais: McLellan Galleries, Glasgow, Escócia; Leeds City Art Gallery, Leeds, Inglaterra; Hayward Gallery, Londres, Inglaterra; A Paintings Show, Karsten Schubert Ltd, Londres, Inglaterra.
1989
Esther Schipper, Colônia, Alemanha; Lorence Monk Gallery, Nova York, Estados Unidos.
1988
Karsten Schubert Ltd, Londres, Inglaterra; Freeze Part II, Surrey Docks, Londres, Inglaterra.