| Por Pierre-André Lienhard
Um Grande Brincalhão frente ao Universo
O trabalho de Ugo Rondinone parece organizar-se de modo a evitar qualquer tentativa de apreendê-lo por inteiro. Qual será, com efeito, o denominador comum entre paisagens pré-industriais desenhadas a nanquim sobre imensas folhas de papel, grandes telas circulares nas quais os anéis concêntricos de cores vivas formam a imagem de um alvo, vídeos que mostram, em planos fixos e sem montagem, a banalidade dos elementos da realidade, retratos fotográficos em que um recurso obtido pela manipulação de um computador permite ao artista utilizar o corpo de modelos femininos ou ainda cadernos que propõem - em um formato que lembra o modelo narrativo das histórias em quadrinhos - um diário íntimo fictício em que as imagens do artista prisioneiro atrás de grades ilustram um texto que relata o curto tempo de uma relação amorosa esclerosada? Devemos admitir que esta pluralidade de formas e expressões, que podem coexistir no interior de uma mesma apresentação é, no mínimo, tão importante para a apreensão desta postura artística quanto os produtos considerados isoladamente.
Estes, por seu lado, propõem, imediatamente e de maneira balizada demais para deixar entrever a pista falsa, uma série de referências. Devemos levar em consideração os redirecionamentos, mais ambíguos do que parecem aqui 'ao arlivrismo'que o século passado conferia às paisagens, à op art em relação aos alvos, ao jogo de distorções de certos representantes da body art em fotografias. Seria um erro aproximar Rondinone das concepções pós-modernas dos artistas das citações e das apropriações. Em vez de falar sobre redirecionamentos, seria mais vantajoso ver seu trabalho do ponto de vista das apropriações. Tudo se passa, na verdade, como se, a partir de apropriações formais a apropriações de máscaras, ele se entregasse a um vasto jogo de papéis diferentes que aproximam o trabalho do artista do trabalho do ator. Com uma agilidade que nada deve à do acrobata ou do mágico, ele se empenha em multiplicar estas apropriações e a garantir que nunca seja possível fazer uma interpretação unívoca de sua obra. Como o trabalho de um acrobata, cujo equilíbrio é garantido por uma vara, o trabalho de Rondinone adquire seu equilíbrio das ambivalências que integra.
Rondinone explicitou esta estratégia que consiste em não estar nunca onde esperam que esteja já em 1995 no título da série de manipulações fotográficas: I Don't Live Here Anymore, frase que faz eco, em certa medida, à posição do artista, expressa por Baudelaire em seu poema em prosa intitulado "Anywhere out of the world"- que já é uma apropriação. O poeta afirma, particularmente: "Acho que estarei sempre lá onde não estou". Lembremo-nos de que "Le Spleen de Paris", ao qual este texto pertence, é todo permeado por figuras de saltimbancos, loucos e bufões, figuras emblemáticas da condição do artista e da arte, de sua exterioridade ou de sua 'ex-centricidade' em relação ao mundo.
Será que devemos, portanto, ficar surpresos por Ugo Rondinone convocar, por sua vez, a figura do palhaço em seu trabalho? Ela aparece desde 1995 em grandes grafites pintados com spray prateado no muro da exposição, antecipadamente enegrecido. Em seguida tem lugar uma ação - 1996 - em que Rondinone, vestido de palhaço, se fotografa em vários ângulos, acionando o disparador da Polaroid que segurava debaixo do braço. O palhaço também é o tema principal da contribuição que o artista trará a São Paulo. Uma série de sete monitores de vídeo colocados no chão apresenta palhaços inativos. No teto, vários dispositivos sonoros munidos de sensores prontos a identificar a presença de espectadores e a mantê-los sob uma enxurrada de risadas e de latidos à medida que se movem pelo espaço da sala. Ao contrário de Clown Torture, de Bruce Nauman, os palhaços de Rondinone se recusam a adotar seu papel social. De modo sutil e ambíguo, sua instalação brinca com os clichês que reduzem o palhaço ao papel de mediador, permitindo ao homem que ria dele mesmo. Ela acentua todo o artificialismo desse baile de máscaras e inverte seu mecanismo, não deixando, porém, de introduzir ironicamente um corpo estranho ao propor uma equivalência com a linguagem animal.
De quem ele está zombando? Depois de Joyce, será que Rondinone pretende receber o título de great joker at the universe?
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| Nasceu em Brunnen, em 1963. Entre 1986 e 1990 estudou na Hochschule für angewandte Kunst, em Viena. Atualmente vive e trabalha em Zurique.
Exposições individuais
1996 Centre d'Art Contemporain, Genebra, Suíça; Museum für Gegenwartskunst, Zurique, Suíça; Galerie Six Friedrich, Munique, Alemanha; Le Case d'Arte, Milão, Itália. 1995 Galerie Walcheturm, Zurique, Suíça; Migrateurs, ARC Musée d'Art Moderne de la Ville de Paris, França; Galerie Froment-Putman, Paris, França. 1994 Galerie Six Friedrich, Munique, Alemanha; Galerie Daniel Buchholz, Colônia, Alemanha. 1993 Galerie Ballgasse (Pakesch & Stejskal), Viena, Áustria; Centre d'Art Contemporain, Martigny, Suíça. 1992 Galerie Walcheturm, Zurique, Suíça. 1991 Galerie Walcheturm, Zurique, Suíça; Galerie Pinx, Oskar Schmidt, Viena, Áustria. 1990 Kunstmuseum Luzern, Lucerna, Suíça.
Exposições coletivas
1996 Non! Pas Comme Ça!, Centre d'Art Neufchâtel, Suíça; Conversation Pieces II, ICA, Filadélfia, Estados Unidos; Cabines de Bains, Piscine de la Motta, Fribourg, Suíça. 1995 Livres d'Artistes, Centre d'Art Contemporain, Genebra, Suíça; Landschaft mit dem Blick der 90-er Jahre, Mitterheinmuseum, Koblenz, Alemanha; Museum Schlossburg a.d. Saale; Haus am Waldsee, Berlim; Oh Pain Oh Life, Helmhaus, Zurique, Suíça. 1994 Kunsthalle Palazzo, Liestal com Albrecht Schnider e Félix Vallotton; Endstation Sehnsucht, Kunsthaus Zürich, Zurique, Suíça; Passing Through, Galerie Walcheturm, Zurique, Suíça; O Boy, It's a Girl, Kunstverein München, Munique, Alemanha; Messepalast Wien, Viena, Áustria; Bad zur Sonne, Steirischer Herbst, Graz, Áustria. 1993 Changing I Dense Cities, Shedhalle Zürich, Zurique, Suíça; Prospekt 93, Frankfurter Kunstverein, Frankfurt, Alemanha; Hellbound, Centre d'Art Contemporain, Martigny, Suíça; Die Sprache der Kunst, Kunsthalle Wien, Viena, Áustria; Frankfurter Kunstverein, Frankfurt, Alemanha.
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